Opinião: E SE AMÍLCAR ESTIVESSE VIVO?

Esse mês de setembro nos convida a refletir sobre certos acontecimentos que fizeram correr sangue na nossa Guiné-Bissau. São quarenta e quatro anos depois do forçado desaparecimento de Amílcar Cabral. Quarenta e quatro anos depois da proclamação da nossa justa independência, a Guiné-Bissau ainda se encontra numa navegação contra a maré à procura de terra firme. O país já viveu muitas instabilidades desde a liquidação a sangue frio, do camarada Amílcar Cabral, expoente máximo da luta de libertação nacional e um dos mais notáveis intelectuais e pan-africanistas do século XX. Até a data presente, a mão que matou o camarada Amílcar Cabral continua ceifando vidas inocentes em nome do Estado. Com base nessa inquietação, paira sobre minha cabeça, essa questão, e, com certeza, seria uma questão da geração pós-independência/Homem novo, e se Amílcar estivesse vivo?

Procuro encontrar respostas dentro de mim e euforicamente respondo que, se Amílcar estivesse vivo, Guiné-Bissau seria igual à Singapura; às vezes afirmo tristemente também, que o país se encontraria nas piores condições possíveis. No entanto, prevalecem últimas respostas que chegam a mim: se Amílcar estivesse vivo, a Guiné-Bissau ultrapassaria a velocidade em que se encontra.

Pondo fim a essas minhas respostas confusas, começo por ressaltar que alguns filhos da Guiné já tiveram muitas das oportunidades que Amílcar Cabral teve, como a de ir estudar em Portugal. A exemplo do ilustre Honório Pereira Barreto, um guineense assimilado que ao invés de usar sua inteligência para defender o povo guineense, fez ao contrário. Amílcar Cabral não foi para Portugal para se formar em defesa dos povos da Guiné e de Cabo-Verde. De facto, a oportunidade de estudo que encontrou respondia às necessidades da metrópole: estudar soluções para o problema da seca que assolava as ilhas de Cabo-Verde e levar adiante o plano de lançamento da agricultura na Guiné Portuguesa. Não obstante isso, desde muito cedo Amílcar Cabral descobriu o disfarce de lobo colonizador e começou a se-interessar pelas ideologias da revolução.

Nesse sentido, Amílcar lançou mão de duas oportunidades que lhe permitiram, futuramente, levar a cabo sua ambiciosa missão de libertar os povos da Guiné e de Cabo-Verde do jugo colonial. Primeiro, ao se familiarizar com a ideologia do marxismo-leninismo, ele a vincula com a aspiração do povo guineense na época. Sua segunda oportunidade, foi o recenseamento agrícola de 1953, quando ele percorreu os quatro cantos da Guiné durante sete meses. Por causa dessa experiência, Abel Djassi pôde aproximar-se das bases da população, estabelecendo assim uma ampla rede de contactos no interior da Guiné. Em suma, em vez de usar seu diploma para enriquecer-se- como fazem alguns hoje, o agrónomo preferiu uma tarefa mais árdua: opor-se ao sistema de opressão português.

Como em qualquer profeta, sempre há um sinal de chamamento para as missões, e o de Amílcar foi em 1953 em Orango-Grande. É importante pensar as ilhas Bijagós pelo seu importante papel na história de resistência dos povos da Guiné contra o sistema colonial português, por terem sido sede do último reduto das resistências em 1936, mais especificamente em Canhabaque. Essa região sinaliza pela primeira vez, quando Amílcar Cabral levantou a mão para dizer “BASTA”. Humanamente, Cabral pôs-se no lugar da mulher que estava a ser chicoteada por um chefe de posto português e esse basta foi ampliado para conter todas as formas usadas por Portugal em maltratar, explorar e humilhar os povos da Guiné e de Cabo-Verde e que ditou a merecida independência desses dois países.

Depois da independência nacional, a muitos filhos da Nação foi dada a oportunidade de conduzi-la a um ameno: dentre eles, alguns fizeram o contrário do esperado, resultando no facto de que continuamos sem escolas para nossas crianças, sem oportunidade para os jovens, sem maternidade de qualidade para nossas mulheres; em pleno século XXI, Guiné-Bissau continua sem uma universidade pública sequer. Tudo isso ocorre, porque o Homem novo que Amílcar Cabral sonhou ver livre das amarras coloniais se julga o legítimo e dono de todos poderes. Com base nisso, volto para minhas questões: se Amílcar estivesse vivo, sentaria hoje para negociar e partilhar poder com o adversário vencedor, jogando fora as aspirações do povo manifestadas por meio dos votos? Ele mesmo criaria um governo ao qual convém mandar e desmandar? Será que Abel Djassi ficaria eternamente no poder, como fazem muitos dos líderes africanos de hoje? E se Cabral estivesse vivo, será que ele assumiria essa ambição desmesurada de políticos que, depois de terem traído a ideologia de libertação em detrimento de suas gananciosas ambições, estão matando seu próprio povo com sua distorcida democracia?

É hora de nos revoltarmos radicalmente para encontrarmos o rumo certo. Finalizo esse pequeno texto com essa determinação de Amílcar Cabral, recuperada por Carlos Lopes: “Vi gente morrer de fome em Cabo Verde e vi gente morrer a pauladas na Guiné (com surras, pontapés e trabalho forçado), entende? Essa é a razão da minha revolta”.

 

UNKRANDA!!!!!!!

 

 

 

 

Por: Neemias António Nanque

neemiasoficial@gmail.com

SFC, 20/09/2017.

 

 

3 thoughts on “Opinião: E SE AMÍLCAR ESTIVESSE VIVO?

  1. SE ELE ESTIVESSE VIVO PODERIA TER VONTADE DE ELIMINAR: CIPRIANO CASSAMÁ (O POLÍTICO PARVALHÃO), MANECAS DOS SANTOS (O DIABO), MAUEL SATURNINO, LUIS OLIVEIRA SANCA, DOMINGOS SIMÕES PEREIRA, AGNELO REGALLA, OSCAR BARBOSA KANKAN (O MENTIROSO MOR), MÁRIO DIAS SAMI, CARLOS GOMES JÚNIOR (KON GARANDI ASSASSINO), FERNANDO GOMES (O ASSASSINO), VICENTE FERNANDES (ROSTO DI FORONTA), PASTOR PECADOR, CARLOS CORREIA, FRANCISCA PEREIRA…

  2. Muito profundo!
    E se Amilcar estivesse vivo, aprovaria pelo menos esse sistema politico corrupto que instalou em toda África ocidental?

    Gostaria apenas de aplaudir o teu parecer, assim com a Guiné-Bissau, Angola precisa de jovens que refletem em torno disso! É preciso questionar esse sistema que se instalou nos nossos paises,África em nada tem culpa, os nossos irmãos, os nossos compatriotas distorcem o sentido de pátria. Nos nossos mesmos paises, nós vivemos oprimidos! o pior ainda, é que o opressor, fala a nossa língua, bebe da nossa água, e diz que tem o mesmo antepassado.

    Até quando viveremos assim?
    Quem dera as organizações Mundias como ONU, UNICEF, Banco Mundial, FMI, ajudassem, mais eles são os principais fomentadores da discórdia, da divida, da guerra, e de toda miséria que vivemos.

    UM dia, assim como o MArtin tinha um sonho…Nós temos os nossos!
    E eu termino citando umas das minhas frases: “Quando as tabankas se unirem, não haverá governo nem exercito para parar a revolta do povo sufocado e oprimido”

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