Negócio de madeira: PRIMEIRO-MINISTRO NABIAN E BRAIMA CAMARÁ NOS RADARES DA POLÍCIA JUDICIÁRIA

[O DEMOCRATA, 30.12.2020] A Policia Judiciárila (PJ) está a Investigar o negócio de madeiras que envolve figuras políticas e dirigentes do atual regime.  À cabeça do negócio estarão o Primeiro-ministro Nuno Gomes Nabian e Braima Camará. A investigação envolve Igualmente Botche Candé e Abel da Silva Gomes, respetivamente ministros de Interior e  de Agricultura. A PJ iniciou a investigação em outubro passado e tem hoje nas mãos um dossiê de cerca de 900 páginas de autos.

Fonte ligada ao processo confidenciou ao Jornal O Democrata que Botche Candé já foi ouvido no âmbito do inquérito e estão em curso as formalidades para a eventual audição de Nuno Gomes Nabian. A fonte narrou o filme que começou em Outubro, na sequência do anúncio pelo executivo do fim da moratória que proibiu, durante cinco anos, o abate de árvores nas florestas da Guiné Bissau e a introdução de um regime especial que autoriza o abate seletivo de “certas espécies” de arvores. 

CONFRONTO ENTRE A POLÍCIA JUDICIÁRIA E A GUARDA NACIONAL

Dias depois ao anúncio, uma denúncia do inspetor geral da Floresta chegou à Presidência da República, sobre o transporte de troncos de árvores do interior para Bissau. Segundo a denúncia, o delegado de Floresta em Jugudul terá tentado impedir, sem sucesso,  a trajetória de camiões com contentores para Bissau. O destino era as instalações da Stanacks em Quimetal, zona industrial de Brá, em Bissau.

Segundo as nossas fontes, que requereram o anonimato, as referidas instalações são propriedade  de Braima Camará, empresário e coordenador do Movimento para Alternância (MADEM-G15). A denúncia do inspetor foi comunicada a Úmaro Sissoco Embalo pelo Diretor Geral Braima Mané. Por sua vez, Sissoco Embalo comunicou à PJ que logo entrou em ação.

Depois de um trabalho de reconhecimento, uma equipa da PJ deslocou-se às instalações que supostamente albergavam os troncos. No local, os agentes foram impedidos de aceder ao interior do complexo com a indicação em como não tinham autorização para entrar, fotografar nem filmar nada. Persistentes, os agentes da PJ foram forçados a abandonar o sítio por elementos da Guarda Nacional armados. 

O filme seguiu para as altas instâncias. Informado do ocorrido, Úmaro Sissoco Embalo convocou uma reunião de emergência no palácio do governo, com a participação do Primeiro Ministro, do Ministro de Interior, da Diretoria Nacional da PJ, Direção das Florestas, do Comandante Geral de Guarda Nacional, Comandante da Brigada Nacional de Proteção de Ambiente de Guarda Nacional. Na reunião, a PJ explicou o episódio que envolvera seus agentes com os da Guarda Nacional. 

Na sua intervenção, conta a nossa fonte, Úmaro Sissoco Embalo condenou a ação da Guarda Nacional e reiterou a exigência e autorização a PJ para prosseguir com a investigação, livremente. 

“Ainda que a PJ tivesse indícios para investigar na Presidência da República teria as portas abertas”, lançou Embaló. No encontro, quer Nuno Gomes quer Botche Candé, ninguém assumiu a autoria da ordem da expulsão dos agentes da PJ do Stanacks. O Comandante Geral da Guarda Nacional também disse desconhecer as circunstâncias que envolveram o incidente. 

A reunião pariu um “aparente consenso” sobre a necessidade de a Investigação avançar. 

No interior do complexo estão instaladas máquinas importadas da China com a capacidade de transformar grande quantidade de troncos em madeira que seria exportada para República Popular de China.  

Na operação, a PJ deteve um cidadão guineense (Guto) e dois chineses. No interrogatório, os detidos atribuíram a propriedade do negócio “informal” ao Nuno Gomes Nabian, Primeiro-ministro.

Inicialmente, a PJ tinha constituído o complexo Stanacks como fiel depositário dos troncos e madeiras apreendidas. Mas, depois do incidente que opôs seus agentes aos da Guarda Nacional, o fiel depositário passou a ser a Direção Geral das Florestas para onde os troncos foram transferidos. A operação de transferência criou revolta do Primeiro Ministro Nuno Gomes Nabian e de Braima Camará. Os dois tentaram ameaçar os inspetores da PJ. O próprio Braima Camará exerceu pressão sobre o Procurador Geral da República Fernando Gomes, acusando-o de estar a executar um plano encomendado por Úmaro Sissoco Embalo.

Pressionado por Braima, o PGR terá tentado pedir à PJ que conduzisse o processo com moderação, o que lhe foi recusado pelos inspetores encarregues do dossiê em nome da sua liberdade profissional garantida por lei. 

A investigação da PJ permitiu descobrir que terá sido o Nuno Gomes Nabian quem financiou a operação de transporte dos troncos de árvores do interior para Bissau. 

Nuno Gomes Nabian entregou a Botche Candé a soma de 15 milhões de FCFA para custear a logística do transporte de troncos para Bissau. O dinheiro, conta a fonte, foi partilhado com o Comandante Geral da Guarda Nacional, Sadio Sissé que recebera as ordens para criar as condições de execução da operação. O delegado da Floresta em Jugudul que queria se opor a passagem dos camiões foi ameaçado por elementos de Guarda Nacional que acompanhavam a operação.

EMPRESÁRIOS CHINESES E O TRÁFICO DE INFLUÊNCIA

O negócio da madeira é antigo no país. Na sequência de golpe militar de 12 de Abril de 2012, empresários chineses invadiram Bissau com conexões a níveis  político e empresarial. A investigação da PJ apurou que os chineses detidos no âmbito de atual processo são amigos pessoais de Nuno Gomes Nabian e financiadores da sua campanha eleitoral à Presidência da República em 2014.

Os chineses financiaram a campanha com a promessa de contrapartidas importantes em caso da vitória do candidato independente. A derrota deste colocou todo investimento na água. No entanto, a ligação entre Nabian e os chineses mantém-se devido as dividas pendentes.

“A PJ está na posse de informações que apontam para investimento considerável do grupo de chineses na compra da maquinaria e o dinheiro distribuído aos parceiros nacionais ronda os 8 milhões de dólares americanos”, adianta a fonte. Quem são os beneficiários de tal montante? É a questão de fundo que está a criar discórdia e tensão entre Úmaro Sissoco Embalo, Nuno Gomes Nabian. O primeiro vê de maus olhos o envolvimento de seus “diretos adversários” políticos de hoje (Nuno e Braima) num negócio que gera somas avultosas. Mais que um simples negócio de madeira, trata se um dossiê com conexões politicas profundas.

No retrovisor da investigação em curso  descobre-se um “busness” feito a margem da lei. O grupo de chineses, amigos “sócios” de Nuno Gomes Nabian estão a operar no país  em total irregularidade. Nenhuma empresa fora criada no Centro da Formalização de Empresas até no início da investigação da PJ.  Seis contentores de máquinas para serração foram importados e despachados em nome de Malaika 2, num valor risonho de 3 milhões de FCFA!

Atrás da associação entre Nuno Gomes Nabian e Braima Camará, a PJ vê um esquema de tráfico de influência que permitiria o sucesso do negócio. 

Convidado no negócio, Braima Camará, enquanto coordenador do MADEM-G15 teria uma influência sobre o ministro de Agricultura, Abel da Silva Gomes (membro do mesmo partido) que inicialmente não concordou com o negócio.  Progressivamente, Abel da Silva Gomes foi arrastado.

A fuga ao fisco é um facto constatado pela PJ que admite fortemente a possibilidade de um esquema de branqueamento de capital. 

“Perante um negócio que envolve somas avultosas movimentadas a margem do circuito financeiro legal,  não se pode afastar a possibilidade de branqueamento de capital”, insiste a nossa fonte em condições de anonimato. 

Por outro lado, o interesse de Úmaro Sissoco Embalo no dossiê de investigação que visa Nuno Gomes Nabian e Braima Camará, é longe de ser neutro. O apoio incondicional de Sissoco à PJ tem motivações políticas evidentes, nota um observador atento da política nacional. De um lado, é do interesse de Úmaro Sissoco Embalo fragilizar o atual Primeiro Ministro de forma a colocá-lo fora da Primatura. E doutro lado, conter a influência de Braima Camará através de corte nas suas torneiras financeiras. 

A audição eventual de PM pelo Ministério Público será provavelmente o ponto mais alto desta telenovela com inúmeros episódios. E uma audição de Braima Camará? Caberá ao MP decidir que tem agora o processo em cima da mesa.

O Democrata contactou o gabinete do PM e o Assessor de imprensa, Sidney Monteiro, indicou que de momento não há reação oficial ao assunto. 

“Ainda não está prevista qualquer reacção por parte do PM em relação ao assunto, como deves calcular, a fazer jus da notícia, ele foi indiciado, portanto desconhece os termos, e deve aguardar para melhor pronunciar. Mas a haver qualquer reacção serão convocados”, afirmou Sidney.

Até à conclusão deste artigo, não foi possível obter as reações do gabinete do Ministro de Interior, Botche Candé e do deputado Braima Camará.

Por: Redação

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