[Campanha eleitoral_ENTREVISTA] O cabeça de lista do Partido da Renovação Social (PRS) e candidato ao cargo de primeiro-ministro nas eleições legislativas, Florentino Mendes Pereira, declarou que vai apostar na diversificação da agricultura e na criação das infraestruturas de base para os setores da educação e da saúde. Acrescentou que o país não pode continuar a monocultura docajú, porque tem terra arável e condições climatéricas boas, pelo que deve trabalhar na implementação de políticas que privilegiem a formação, a criação de uma escola agrícola e, sobretudo a mecanização do setor para sairmos da agriculturatradicional, de subsistência.
O candidato do partido do milho e arroz ao cargo do chefe do governo fez estas afirmações na entrevista exclusiva ao Jornal O Democrata para falar do programa eleitoral do seu partido, bem como dos setores prioritários que merecerão uma atenção especial e que permitirão o desenvolvimento da Guiné-Bissau.
“Devemos criar infraestruturas de base, apostarmos na formação e capacitação dos nossos professores, estabelecermos ou retomarmos programas com os parceiros de desenvolvimento da Guiné-Bissau e os sindicatos do setor do ensino para garantir a estabilidade do setor. Não podemos continuar nesta situação onde todos os anos há problemas no término do ano letivo, dificuldades de concertação entre os sindicatos e o governo. Se o PRS for à governação, não haverá esses problemas, porque partilhamos a mesma preocupação com os sindicatos. Os professores querem melhores condições de vida e laborais, vamos trabalhar para garantir tudo isso. Não podemos assumir a governação do país e pensar fazer o contrário”, assegurou.
Sobre o volume da massa salarial que atualmente é objeto de crítica de analistas políticos, disse que a massa salarial não é um problema nominal, porque o que lhes interessa neste momento é a massa salarial real. Acrescentou, neste particular, que o problema não reside na quantidade, no valor, mas sim nas pessoas que estão na função e que recebem esse dinheiro.
O Democrata (OD): A Guiné-Bissau carece de quase tudo. Razão pela qual é dito que tudo é prioridade. Fala-nos de forma sintética do programa eleitoral do Partido da Renovação Social (PRS), sobretudo das áreas prioritárias que merecerão uma atenção especial?
FLORENTINO MENDES PEREIRA (FMP): A Guiné-Bissau é um país com muitos recursos naturais e humanos. Independentemente de ser um país com recursos naturais em abundância e humanos, continua a ser um dos países mais pobres do mundo. Nestas eleições, considerando que estamos a caminho de celebrar meio século de independência no próximo dia 24 de setembro com enormes atrasos no capítulo dodesenvolvimento, decidimos enumerar cinco áreas prioritárias: setores sociais, o capital humano, como prioridade das prioridades.
OD: Regista-se neste momento um aumento dos preço de produtos da primeira necessidade associado a campanha de comercialização da castanha de cajú que está aquém das expectativas. Que estratégias vai adotar a curto prazo para contrariar essa realidade se vencer o escrutínio de 04 de junho?
FMP: Em relação ao aumento de preços dos produtos de primeira necessidade que está neste momento insuportáveis, devo dizer-lhe que se deve à falta de uma estratégia sólida para poder baixar os preços dos produtos. Temos estruturas de diferentes produtos e é só trabalhar essas estruturas para minimizar os impactos. Alguns devem estar a criar inflação. Temos países vizinhos com os quais partilhamos o mesmo espaço, mas a situação deles está controlada. As economias destes países têm estruturas de preços diferentes, mas estão a conseguir controlar. Portanto, não se justificava essa subida de preços na Guiné-Bissau. Nós vamos mexer nas estruturas e adotar medidas para baixar os preços.
OD: A Agricultura é considerada como a base económica do país. Há várias décadas, nenhum governo conseguiu apresentar uma solução e progressos neste setor. Que mecanismos o seu governo vai apresentar aos guineenses para revolucionar o setor, à semelhança do Senegal, onde foram feitos grandes investimentos e hoje produzem-se milhões de toneladas de arroz, mancara, feijão e milho?
FMP: É verdade. A agricultura é um setor primário e tem um peso significativo na nossa economia e no nosso Produto Interno Bruto-PIB. Só a castanha de cajú representa 80% do nosso BIP. O que vamos fazer nesse setor é simples: primeiro, vamos diversificar a nossa agricultura, porque não podemos continuar na monocultura do cajú. O país tem uma terra arável e condições climatéricas boas, portanto deve aproveitar essas potencialidades, apostar na formação, criar escolas de agricultura, mecanizar o setor para sairmos da forma tradicional de cultivar que é quase arcaica e aproveitarmos a terra arável que temos para sairmos deste modelo e passarmos a ser um país produtor.
DO: O setor da Educação tem andado paralisado e há vozes críticas que defendem a reforma do sistema. Partilha a mesma ideia?
FMP: No setor da educação tudo é prioritário. Um setor onde um ano letivo não termina de forma regular, devido às greves. Não há infraestruturas e o país continua a registar um índice de analfabetismo de cerca de 46%. Devemos criar as infraestruturas de base, apostar na formação e capacitação dos nossos professores, estabelecer ou retomar programas com os parceiros de desenvolvimento da Guiné-Bissau e os sindicatos do setor do ensino para garantirmos a estabilidade do setor. Não podemos continuar nessa situação onde todos os anos há problemas para terminar ano letivo e negociações entre os sindicatos e o governo.
OD: Que mecanismos usarão para negociar primeiramente com os sindicatos do setor da Educação e respondermos às suas reivindicações e relançarmos o setor para atingirmos os níveis da sub-região?
FMP: Se o PRS for à governação, não haverá esses problemas, porque partilhamos a mesma preocupação com os sindicatos. Os professores querem melhores condições de vida e laborais, vamos trabalhar para garantir tudo isso. Não podemos assumir a governação do país e pensar fazer o contrário.
OD: O candidato concordará quando se diz, na praça pública, que há evolução no setor de saúde?
FMP: Praticamente, os dois setores têm as mesmas preocupações, a começar pelas infraestruturas de base de saúde, centros de saúde, postos de saúde em várias localidades. Nos centros urbanos, os hospitais não têm condições. Iremos operar a mesma dinâmica que vamos operar no setor da educação. Construirmos infraestruturas nessas localidades, equipá-las e apostar na formação dos quadros técnicos de saúde, nomeadamente parteiras, enfermeiros e médicos especializados para dar respostas a vários problemas que o país tem. Criar centros para tratamentos especializados.
OD: As infraestruturas rodoviárias são quase inexistentes, aliás, o candidato provou isso nestas andanças da campanha eleitoral. Que medidas ou iniciativas levará a cabo para melhorar as estradas?
FMP: No nosso programa, quando falamos de crescimento económico, priorizamos as infraestruturas básicas de desenvolvimento, as estradas. Nesta perspectiva, vamos construir estradas que consigam trazer benefícios económicos, devido ao enclavamento de algumas zonas. Vamos trabalhar para construir as estradas sociais e pontes, portanto há muita coisa a fazer nesse setor. Aquilo que constatamos no terreno é de facto lamentável.
OD: A massa salarial da Guiné-Bissau situa-se na ordem de seis biliões de francos CFA, o que causa uma dor de cabeça?
o Tesouro Público. Caso vença as eleições de domingo, como pensa resolver essa situação?
FMP: A massa salarial para mim não é um problema nominal. O que interessa neste momento é a massa salarial real. O problema não reside na quantidade, no valor, mas sim nas pessoas que nós temos na função pública e que recebem essedinheiro. O ponto de partida seria começar neste problema, priorizar funcionários de qualidade e produtivos, criar instrumentos não só para reduzir a massa salarial, mas tambémpara a incidência sobre as receitas fiscais, para permitir o respeito das metas da sub-região, onde estamos neste momento com 67% da massa salarial sobre as receitas fiscais, quando a norma na sub-região prevê 35%. O país terá que trabalhar para baixar estes dados e criar as condições para que os funcionários públicos recebam um bom salário.
OD: A dívida pública da Guiné-Bissau representa 80% do PIB segundo um relatório recente do Banco Mundial. O que terá levado o país a insustentabilidade financeira e que mecanismos para libertarmo–nos do fardo da dívida?
FMP: Na gestão das nossas finanças públicas, uma das atenções que devemos ter é a gestão da dívida pública. Nós conseguimos, no âmbito da iniciativa do Programa de Perdão de Dívida aos Países Altamente Endividados- IPIC, três pontos fundamentais deste programa do Fundo Monetário Internacional, nomeadamente a elegibilidade, ponto de conclusão e de decisão. É um programa com três etapas, que felizmente a Guiné-Bissau, salvo em 2010, superou e conseguiu atingir o ponto de conclusão e beneficiou do perdão de dívidas e diminuiu significativamente esse rácio. A média da sub-região é de 70%, e hoje estamos nos 80.9%. É preciso melhorar o serviço da dívida, sobretudo sermos prudentes e inteligentes na contração de dívidas. A dívida a curto prazo ou de consumo não deve ser a nossa visão ou opção neste momento.
Devemos contrair dívidas para investimento. Se for para consumo, deve haver uma dívida razoável, não inaceitável, com taxas e juros que não são concecionais, o que no fundo acaba por ser juros de bancos comerciais.
Ou seja, devemos contrair dívidas concecionais com taxas de juros não superiores a 2 % e com período de graça aceitável de, por exemplo, 10 a 25 anos de graças. Essas negociações devem ser estabelecidas com grandes instituições financeiras internacionais, para investirmos nos setores chaves e fundamentais da nossa economia ou nas infraestruturas que podem impulsionar o crescimento económico.
OD: A justiça é percebida pelos cidadãos nacionais como ausente. Qual será a estratégia para edificar um aparelho judicial eficiente e igualitário?
FMP: Primeiro vamos criar condições para que os juízes sejam independentes, mas tudo isso dependerá. É um setor que requer a colaboração dos outros setores, para que as duas magistraturas tenham condições de rever alguns diplomas legais, caso seja necessário, para que os juízes possam ministrar a justiça com toda a liberdade, independência e juízo próprio e que não se deixem influenciar por outras razões.
OD: O setor dos Transportes e Telecomunicações constitui um grande desafio para o país. Fala-nos da estratégia definida no vosso programa eleitoral para relançar estes setores, sobretudo as telecomunicações?
FMP: Há vários tipos de transportes. Vamos criar as condições, construir estradas. A Guiné-Bissau deve criar as condições para ter a sua própria companhia e navios para as ligações entre o continente e a parte insular, bem como entre ilhas. É inaceitável que a nossa população que vive na zona insular continue a viver no isolamento total do resto do país. Temos que trabalhar para mudar esse cenário.
OD: O maior debate hoje a nível do continente africano é a independência económica e parece que a Guiné-Bissau passa ao lado e o assunto não é discutido nesta campanha. Qual é a opinião sobre a moeda Eco que se perspectiva para a sub-região. O PRS partilha a mesma posição dos oitos países da UEMOA?
FMP: A África deve ter a sua moeda própria. Estamos a favor da implementação da moeda ECO. É natural que as negociações estejam em curso. A Guiné-Bissau, enquanto Estado já deu o seu aval e a comissão da CEDEAO está a trabalhar nesse sentido, embora esteja a desparrar-se com algumas situações. Pensamos que em breve esse assunto vai ser ultrapassado.
OD: Relativamente à Zona Comercial Continental Livre Africano, que mecanismos vai apresentar para que a Guiné-Bissau não se torne uma vítima engolida pelos gigantes, mas sim que o país tire proveitos capazes de alavancar a economia do país por meio desta iniciativa continental?
FMP: O mais importante na zona comum de comércio é a produção interna. O país deve produzir e ter produtos e apostar na qualidade. Tendo produtos próprios, será o mercado a reagir. Devemos trabalhar para aumentar a produção de qualidade, ter laboratórios de qualidade para certificá-los para ter acesso a esse mercado de concorrência. É a qualidade que conta.
OD: O terrorismo continua a ser uma ameaça eminente à sub-região. Que mecanismos devem ser usados para lutar contra este fenômeno?
FMP: É uma ameaça mundial que requer uma luta comum de todos os países do mundo. Os países como a Guiné-Bissau, com poucos recursos, nunca serão capazes de enfrentar este fenómeno. O que vai contar é a cooperação internacional, bilateral e multilateral. Apesar das dificuldades, a Guiné-Bissau tem a responsabilidade de criar as mínimas condições para equipar as suas forças de defesa e segurança e especializar os seus quadros nesta área e contra este fenómeno.
Por: Aguinaldo Ampa/Filomeno Sambú



















