Opinião: FRANCO CFA A MOEDA ASSASSINA

Franco das colónias francesas de África (franc des colonies françaises d’Afrique), denominado mais tarde de Franco da Comunidade Financeira de África, foi criada em Dezembro de 1945 através do decreto no 45-0136 assinado pelo General Charles de Gaulle, com o objectivo de controlar os capitais que circulam principalmente nas suas colónias. A zona franco teve a sua origem nos anos 30 do século XX, mas o Franco CFA em si, foi oficialmente criado em 1945.

Quatros princípios regem a cooperação monetária entre a França e os países da zona franco, a saber:

1) a paridade fixa com a moeda de referência (neste caso euro);

2) a garantia da convertibilidade ilimitada pelo tesouro francês;

3) a livre transferibilidade da moeda no interior da zona franco;

4) a centralização das reservas de câmbio.

A paridade fixa do franco com o euro é garantida pelo tesouro público francês, mas em contrapartida, os países africanos da zona franco, são obrigados a depositar 20% de sua emissão monetária (sob forma de divisa) junto ao tesouro público francês. Atualmente, a taxa de cobertura de emissão monetária ultrapassa 112%, isto é, 5171,8 bilhões de franco CFA

Na realidade significa que para emitir 1 franco, o banco central (da zona franco) deve depositar 0.20 cêntimos no tesouro francês como garantia de paridade fixa entre franco e euro, mas os 0.20 cêntimos deve ser depositado em forma de divisa. Isto é, entregamos 1 franco, mas temos direito só a 0.80 cêntimos, ou então, antes de emitir 1 franco, o banco deve ter no tesouro francês 0.20 cêntimos em forma de divisa como garantia de paridade.

A convertibilidade das moedas emitidas pelas três instituições de emissão da zona franco, e a livre circulação das mesmas dentro da zona euro é garantida sem limite pelo tesouro francês, em contrapartida, as reservas de câmbio devem ser centralizadas. Para garantir a “convertibilidade ilimitada” de Franco CFA com o euro, a França exige que os países da zona Franco depositem 50% de suas reservas cambiais em uma conta chamada de “conta de operação” do tesouro público francês, em Paris. Isto é, 50% de todo o dinheiro (em divisa) que vem das importações e exportações vai para o tesouro público francês. Estima-se que mais de 15 bilhões (uns falam de mais de 50 bilhões) de euros estão depositados na dita conta de operação do tesouro público francês.

Na realidade, o Franco CFA não é livremente convertível, porque mesmo entre os países de África Central e Ocidental que utilizam a mesma moeda, a convertibilidade não é permitida. Se um guineense quiser viajar para o Gabão, tem que trocar os seus francos em euro, porque no Gabão o franco de África Ocidental não é aceitável, apesar de utilizarem a mesma moeda.

Oficialmente, cada FCFA é gerido pelo Banco Central, mas a França tem o direito de nomear um membro no conselho de administração do BCEAO (artigo 80 do estatuto do BCEAO) com o direito de voto (e de veto). As decisões do conselho são tomadas por maioria simples dos votos expressos pelos membros. Qualquer decisão tomada pelo BCEAO pode ser vetada pelo Banco da França caso não representar o interesse deste último. As fábricas de produção do FCFA estão situadas no Sul da França, concretamente em Clermont Ferrand, região Bordeaux.

Gostaria de apresentar-vos alguns dados, antes de entrar numa análise critica e mostrar as desvantagens desta moeda:

1.1 Tabela de síntese dos dados económicos dos países da zona franco (zona UEMOA)

 

Países

PIB PIB real (taxa de crescimento %) Taxa de investimento (em %) Balança comercial

(em % do PIB)

 

IDH 2015

(posição)

Em bilhões FCFA Em dólar por habitante
Bénin 5 013,2 781 5,2 29,5 -5,9 167
Burquina Faso 6 576,9 615 4,0 27,4 -1,9 185
Costa de Marfim 18 971,3 1315 10,3 20,2 10,7 171
Guiné-Bissau 600,9 595 4,8 9,3 2,9 178
Mali 7 739,1 802 6,0 17,3 -1,8 175
Níger 4 224,7 415 3,5 50,7 -11,7 187
Senegal 8 049,6 913 6,5 23,7 -15,2 162
Togo 2 367,4 569 5,5 21,2 -15,9 166
Total 53 543,1 7,0 24,4

Indicadores de desenvolvimento 2015, Banco Mundial

O comércio intra comunitário entre os países da zona franco oscila entre 13 e 15%, e 11 dos 15 desses países têm os piores índices de desenvolvimento humano do mundo. Podemos associar esta situação a má governação e corrupção, mas sem esquecermos da importância da moeda na economia, finanças e até melhoria de condições de vida de todo um povo. Os países da zona franco têm poucas possibilidades de financiarem as suas economias, devido aos compromissos que têm com o tesouro público francês.

O Marrocos saiu da zona franco, e passados alguns anos, tornou-se no maior investidor de alguns países da zona franco. A China tem mais de 2500 empresas em África, e investiu mais de 200 bilhões de dólares em África que a fez tornar-se no primeiro parceiro comercial de África. Onde está a França que gere a moeda de 15 países de África?

O franco CFA não foi e nunca será vector de transformação das economias da região, e muito menos da diversificação de suas exportações. Em 2015, as quatro principais economias de África Subsariana beneficiárias de fluxo de investimento direto estrangeiro são Angola (8,6 bilhões de dólares), Moçambique (3,7 bilhões de dólares), Gana (3,1 bilhões de dólares) e a Nigéria (3,1 bilhões de dólares), mas nenhum destes países utiliza o franco CFA. Os principais parceiros económicos da França em África são Nigéria, Angola e África de Sul (nenhum deles utiliza o franco CFA). Se a França tivesse confiança nos países da zona franco e nas suas moedas, por que investir mais nos países que nem utilizam o franco CFA?

No que diz respeito a Guiné-Bissau, não vejo a necessidade de a mesma fazer parte desta zona com um PIB de 600,9 bilhões de FCFA e uma de taxa de investimento de 9,3%, enquanto que a média entre os 7 países da UEMOA situa-se nos 27% anual. Uma economia fraca não tem necessidade de utilizar “moeda forte” e muito menos com uma paridade fixa e condições como aquelas impostas pelo banco da França aos países da zona franco.

Recuando um pouco na história, gostaria de lembrar-vos caros leitores de O Democrata que o Presidente Sylvanus Epiphanio Olympio foi assassinado pouco tempo depois de romper o acordo monetário com a França relativamente ao franco CFA em 1963. O Presidente e pan-africanista Thomas Isidore Sankará foi barbaramente assassinado em 1987 justamente por defender a soberania económica de África. Também não podia deixar de citar o nome do Presidente Modibo Keita que foi envenenado em 1977 por defender uma moeda africana.

O que fazer perante uma moeda que empobreceu e empobrece ainda mais os 15 países de África?

1 – romper o contrato com a França sobre o franco CFA e exigir a devolução de todo o dinheiro depositado no tesouro público francês (estamos mesmo a precisar daquele dinheiro);

2 – criar uma nova moeda africana e fábricas para a produção da mesma no continente africano (a moeda tem que ser africana e controlada pelos africanos);

3 – ir à procura de novos investidores dos países emergentes e desenvolvidos;

4 – estruturar e diversificar as nossas economias (ir à procura de novas fontes de receitas);

 

 

 

Por: Demar dos Santos

Gestor

Julho 2017

 

10 thoughts on “Opinião: FRANCO CFA A MOEDA ASSASSINA

  1. Nunca e tarde para reagir, mas e o momento dos nossos”gestores” tomarem carta no assunto. Nâo porque nâo os temos. Mas porque estâo a demorar tanto tempo?

  2. Obrigado, ja estou ficando a saber sobre o meu direito que tem sido a ser roubado, estou a preparar se um dia eu tivesse a oportunidade de estar nos lugares Da tomada das décisifs

  3. Parabéns pelo artigo que considero muito interessante. Coloco-me em mesma posição no que tange as condições de convertibilidade e emissão de FCFA.

    Sendo a Economia uma ciência aberta, sujeita a diversidade de opiniões e até contradições uma vez que estas são fundamentadas empiricamente e/ou cientificamente. Permita-me destacar o seguinte:

    O FCFA é uma moeda utilizada em duas zonas monetárias: em Africa central (XAF) e Africa Ocidental (XOF). Em Africa ocidental (zona UEMOA) utiliza-se a mesma moeda (XOF) em todos os 8 países membros, sem restrições, pois trata-se de uma união monetária (a moeda transaccionada em Guiné-Bissau é a mesma que se transacciona em Gabão). Mas o franco da África central (XAF) não pode circular em zona UEMOA.

    Uma grande parte das reservas de divisas são conservadas no tesouro francês para garantir sustentabilidade da paridade fixa EUR/XOF. Isto é, aquela quantidade de divisas serve para comprar o fraco, aumentaando a sua a procura do franco em caso de uma depreciação do XOF.
    A França é um dos maiores accionistas do banco oeste africano para o desenvolvimento.

    Um forte abraço!

  4. Caro Demar, obrigado por dados trazidos. Nao obstantes estarmos perante dados que possam defender o contrario, a situacao dos africanos preocupa me bastante, sobretudo, quando se trata de acordos negociados com a europa.
    Sea que somos descendentes Can, filho menor de Noe cuja maldicao e de ser escrivos do escravos ou dos seus irmaos? No passado, nem eramos partes das negociacoes sobre assuntos que nos desrespeitavam, Conferencia de Berlin, hoje, a atraves da nossa mente que nos prisionam, isto porque as elites do poder querem parecer france, portugues e ingles. Para ele, negociar com europeia e pequena, por conseguinte aderem clausulas que estes apostarem. Nao sou este acordo intriga, todos os outros, principalmente aquele que define a base juridica para acordo de pescas. Nunca antes, uma democracia ocidental explorou um pais em crise politica, economica e de patriotismo.
    Deve operar em africa uma nova classe de politicos conscientes da potencialidade do continente e quea aceitem o ser africano e com capacidade de concepcao das suas politicas.

  5. O seu razoamento é viavel, mais para isso o primeror que ten que ter o paissão politicos e politicas creiveis senão o pais dura dois dias.

  6. Obrigado, irmão. Os europeus são astutos oportunistas. Exploram a África de toda forma, autores de todos os conflitos. Nunca são amigos vêem os africanos como povos não merecedores, portanto devem ser escravizados. A África só pode atingir o seu poderio e apogeu se voltar reconhecer às memórias do passado, assumir seu próprio rumo. ( África com os Africanos), expulsar os europeus (brancos).

  7. Santos, concordo plenamente com suas colocações, pois é necessário que os economistas Africanos continuem a insistir nas reais consequências dessa moeda de exploração. Acredito que aos poucos a população africana como um todo vai tendo consciência do controle e do espirito do colonialismo que nunca desistiu. Obrigada pelo panorama!

  8. Caro Sr Gestor Demar dos Santos, eu pessoalmente concordo inteiramente consigo. Mas, antes de proceder por este caminho seria melhor e oportuno esclarecer e sememear em pessoa Africana a noção de responsabilidade.
    O problema prende-se com o facto de o Homem africano ser teimoso e gravemente irresponsável.
    Estamos a falar de problemas que tem afectado o continente africano e os seus respectivos paises e, isto é, um problema que arrasta há já vários anos e continuamos na mesma.
    No caso da Guiné-Bissau, o país de uma falasia simples que todas as vezes escolhe pessoas erradas para liderar o destino da nacao obtemos que os resultados sao tudo o que temos visto e suportamos.
    É certo que podemos fazer desenvolver o nosso país a semelhanca de muitos países ditos desenvolvidos e, para isso, temos em primeira mao que limpar as águas. Isto significa afastar de todos os poderes, as pessoas que nao se sente e nem sao comprometidas com o progresso global da Guiné-Bissau.
    Finalmente, chamarmos o país ao capitulo do tao esperado desenvolvimento.
    Para terminar, agradeço imenso pelo seu documento e a forma com foi bem explicito.

    HÁ DE HAVER SEMPRE UM BOM GUINEENSE…!

  9. nao tive muito tempo para bem ler mas dá para entender que tens uma visao ampla na Economia. e que a sua tese faz muito sentido. para finalizar queria declarar que estou de acordo para saida na moeda fcfa

  10. Boa tarde, já estive em quase todos os Países de língua oficial Portuguesa e o sentimento é quase geral, a descolonização foi mal feita, devería ter existido um período largo para que os Países em causa se reorganizassem, sem guerras! Quanto ao que diz o Sr. Vavas, queria lhe dizer que existem 83 milhões de europeus e que todos somos diferentes. Estão mais pessoas de Africa em Portugal do que Portugueses em toda a África e aqui são muito bem tratados, com todos os direitos que um Português tem. Nunca me vai ouvir dizer para expulsar os Africanos da Europa!

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