Opinião: O QUE NOS DIZEM OS 25,63% DE ABSTENÇÕES REGISTRADAS NAS ELEIÇÕES PRESIDECIAIS DE 24 DE NOVEMBRO?

As eleições presidenciais de 24 de novembro último registraram, de acordo com os dados revelados pela Comissão Nacional de Eleição (CNE), entidade responsável pela organização do escrutínio, elevado número de abstenções, tanto a nível interno quanto externo, a diáspora. De acordo com essa entidade (informações veiculadas inclusive por alguns meios de comunicação nacional e internacional) o total de abstenções está na faixa de 25,63%, a mais alta taxa já registrada desde a abertura democrática em 1994.

As abstenções são próprias das eleições, o que as tornam fenômenos mundiais, ocorrendo assim em toda parte do mundo, pelo menos onde opera o sistema democrático, isto é nas sociedades social e politicamente mais justas e desenvolvidas, se comparadas com a Guiné-Bissau, um Estado que não tem ainda nem meio século de vida  (me refiro ao Estado nos moldes que conhecemos hoje, nascido no século XV, com o surgimento do Estado Moderno).

As abstenções nas corridas eleitorais, dita de outra maneira, constituem uma problemática global, não apenas africana e tão pouco guineense. No Brasil, a título de exemplo, nas eleições presidenciais ocorridas em outubro de 2018, que conduziu o então Deputado Federal Jair Messias Bolsonaro a Presidência da República desse país irmão da Guiné-Bissau, o número de abstenções registradas chegaram a 21,3% do eleitorado habilitado a votar, sendo a taxa mais alta desde as eleições de 1998, quando o Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, se reelegeu. (AGENCIA BRASIL, 2018).

Mas o que explica isso e o que leva as pessoas a absterem-se de um processo democrático de capital importância como esse? Essa indagação parece não fazer sentido nas conjunturas como a guineense, na qual a instabilidade política tem sido clichê. Mas vamos lá: no caso do Brasil, país que trouxe como exemplo, embora a configuração política e algumas outras questões sejam diferentes da Guiné-Bissau, vale ressaltar, a única explicação plausível e que é quase unanimidade hoje entre os cidadãos desse país lusófono é a descrença na classe política.

A classe política brasileira, para ser mais preciso, tem perdido a credibilidade junto da sociedade por razões várias (corrupção ativa e lavagem de dinheiro se destacam como as mais recorrentes) e isso tem refletido sim na hora de votar como evidenciaram os dados do pleito eleitoral acima aludido. A descrença na classe política na sociedade brasileira ganhou ainda proporções maiores com a deflagração da chamada operação Lava-Jato, que desnudou o submundo de “crimes” praticados pela classe política local, levando para a prisão figuras com grande expressão política.

Na Guiné-Bissau, a decepção da sociedade civil em relação a classe política é praticamente a mesma, embora com uma questão adicional (que é naturalmente resultado das diferenças existentes entre as duas sociedades como enfatizei num dos trechos acima) a recorrente instabilidade político-governativa que o povo sempre desejou e que tem sido Calcanhar de Aquiles na vida política nacional.

Ou seja, além de recorrentes casos de corrupção, branqueamento de capital (lavagem de dinheiro, expressão usada no Brasil), má gestão do erário público – que por si só constituem um perigo para o funcionalismo público – o país ainda é enfestado com os recorrentes conflitos internos entre políticos que acabam pondo em causa a agenda de desenvolvimento e a credibilidade do país perante parceiros internacionais, e inúmeras outras questões vitais para a afirmação de um estado de direito próspero e desenvolvido.

A sociedade guineense em geral e a juventude sobretudo, que representa o maior número de votantes no país, estão desiludidas com o ciclo infindável de instabilidade que o país  tem vivido e ainda continua vivendo e, tão só, acredito eu, por essa razão, que uma grande parcela da população tem se furtado de exercer o seu direito de votar, quiçá por achar que essas eleições, assim como diversas outras que já tiveram lugar não vão constituir panaceia para a atual situação de impasse político que o país vivencia.

Deixar de votar resolve o problema? Acredito que não. Mas compreendo a insatisfação desses cidadãos e, em minha opinião, deveriam merecer sim a atenção e a preocupação da classe política, pois de uma ou de outra forma é um recado e tanto para a mesma. Um recado, em minha opinião, na proporção do que o momento requer! Cabe a classe política, no entanto, refletir sobre e tirar a suas próprias ilações.

A sociedade não suporta mais tanta instabilidade e crônicos problemas que adiam o seu desenvolvimento… é chegada a hora de assunção de responsabilidade para com a pátria e o povo… sim, o povo, aquele do qual emana o poder e que lhes conferem-no afim de os representarem. Só isso. O que não é pouca coisa! Aliás, pouca coisa de fato não é, sobretudo para vocês que sempre usufruíram das benesses que o estado oferece.

Apesar de tudo, ainda acredito numa Guiné diferente. Uma Guiné risonha, uma Guiné de oportunidades, uma Guiné próspera. Enfim, é só uma crença, só…, mas que vocês, políticos da minha querida pátria, podem materializar, se quiserem, mas sobretudo se abdicarem de ódio e de coisas negativas que têm bajulado suas mentes e corações. Que Deus nos abençoe e que os dias melhores não tardem! Paz e Bem!

Por: Deuinalom Fernando Cambanco

Mestre em Relações Internacionais

Salvador, Bahia, Brasil.

REFERÊNCIAS:

AGENCIA BRASIL. Taxa de abstenção na eleição presidencial é mais desde 1998. 2018. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2018-10/taxa-de-abstencao-na-eleicao-presidencial-e-maior-desde-1998>, acesso em: 28/11/2019.

DW. Abstenção pode ser resultado da falta de confiança nos políticos. 2018. Disponível em: <https://www.dw.com/pt-002/guin%C3%A9-bissau-absten%C3%A7%C3%A3o-pode-ser-resultado-da-falta-de-confian%C3%A7a-nos-pol%C3%ADticos/a-51476694>, Acesso em: 28/11/2019.

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