CENTIF–GB APREENSIVA QUANTO À AVALIAÇÃO MÚTUA SUBMETIDA AO PAÍS DEVIDO ÀS FRAGILIDADES DAS INSTITUIÇÕES

[ENTREVISTA fevereiro_2021] O presidente da Célula Nacional do Tratamento de Informações Financeiras da Guiné-Bissau (CENTIF – GB), Justino Sá, mostrou-se apreensivo quanto aos resultados da avaliação submetida ao país pelos peritos do Grupo Intergovernamental de Ação contra o Branqueamento de Capital (GIABA), porque as instituições públicas encarregues de lutar contra o branqueamento de capital deparam-se com enormes dificuldades para o cumprimento das suas tarefas.

O responsável da CENTIF falava durante uma entrevista ao nosso semanário para se debruçar sobre a avaliação mútua iniciada pelos peritos do GIABA desde o dia 19 de janeiro.

Os peritos estão a observar se as instituições nacionais encarregues de lutar contra o branqueamento reúnem as condições necessárias para o efeito.

Justino Sá explicou na entrevista que a Guiné-Bissau, em termos de eficácia no combate ao branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, está muito longe de chegar às recomendações do Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI), bem como às do GIABA.

Justino Sá alertou, por isso,  que essa situação poderá ter implicações fortes na avaliação mútua iniciada no país pelos peritos internacionais.

Contudo, sublinhou que a vontade de lutar contra esse “fenómeno nefasto à sociedade” não falta, e referiu que, em relação aos efeitos práticos  do combate relativos a essa matéria, o país está  ainda aquém das expetativas, porque existem apenas dois processos, nomeadamente: o “Navarra e Operação Carapau”.

“Estamos expectantes que o país possa conhecer algo de concreto sobre os efeitos práticos do combate ao branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo”, indicou.    

O responsável da CENTIF explicou que não há manobras para inventar conclusões dessa avaliação mútua que os peritos do GIABA estão a fazer nas instituições nacionais do país e que está também a decorrer na maior parte dos países da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), porque faz parte da política do GAFI e do GIABA, organizações sub-regionais que controlam os países desse bloco, sobretudo no concernente ao combate do branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo.

“Todos os países da sub-região incluindo São Tomé e Príncipe e Comores estão a ser submetidos à avaliação mútua para ver a eficácia do trabalho destes países no combate ao branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo.

Há uma coisa que as pessoas devem compreender, essa avaliação mútua tem duas implicações: primeiro é ver o efeito formal, ou seja, o aspecto prático e formal para se tentar saber se temos dispositivos à altura para combater o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo.

Tendo esses dispositivos, leis e normas, procura-se-á saber qual a utilidade dessas leis no combate a esse fenómeno e a sua implicação na prática, bem como se já existe uma condenação derivada do crime de branqueamento de capitais ou do financiamento do terrorismo, confisco de bens e qual o empenho das estruturas que foram criadas para combatê-lo. Este é o efeito dessa avaliação mútua que está a ser realizada no país”, espelhou.

 FRAGILIDADE DO PAÍS REFLETE-SE NA AÇÃO DOS CRIMINOSOS PARA O BRANQUEAMENTO DE CAPITAIS

O responsável da CENTIF adiantou que essa avaliação mútua irá abranger todas as estruturas do país, tanto públicas como privadas, que trabalham na luta contra branqueamento de capitais e o financiamento ao terrorismo, nomeadamente: a CENTIF, a Policia Judiciaria, o Ministério Público, as inspeções,  alfândegas e contribuições e impostos e estabelecimentos bancários para acompanhar que tipo de trabalho está a ser feito no combate a esse fenómeno. A avaliação, que iniciou no dia 19 de janeiro e termina no dia 1 de fevereiro, é uma prova à eficácia das leis nacionais.

“A conformidade técnica está versada em ver se as leis estão ou não conformes à recomendação do GAFI, ou seja, ver se nós temos dispositivos normativos que estão em sintonia com o padrão universal no combate ao branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo. Para além das leis, há um aspecto interessante que é a eficácia, isto é ver o efeito prático desses dispositivos normativos, porque não basta ter leis. Se temos leis do combate ao branqueamento de capitais por que é que até agora ninguém foi condenado, será que já investigamos um processo de branqueamento de capitais e como está o processo”, questionou.                                

Sobre algumas vozes que afirmam que a Guiné-Bissau é um país vulnerável ao branqueamento de Capitais e ao financiamento do terrorismo, sobretudo pela forma como é movimentado o dinheiro no país, Justino Sá admitiu que a Guiné-Bissau é um país “muito frágil” e essa fragilidade reflete-se na ação dos criminosos para praticarem os seus atos.  Justino Sá  subscreveu, na íntegra, as declarações de algumas vozes que afirmam que a Guiné-Bissau é um país vulnerável ao branqueamento de Capital e ao financiamento do terrorismo.

Porém, o responsável da CENTIF informou que mesmo nos países organizados, com estruturas eficazes para controlar o fenómeno, existem flagelos de branqueamento de capitais. No caso da Guiné-Bissau não se verifica, porque “é um país que conheceu conflitos políticos que devastaram todas as estruturas sociais do país que serviam de proteção ao Estado”.

“Estamos num país onde o Estado não é tido como verdadeiro Estado, porque temos essa fragilidade também nas estruturas da defesa e segurança. Quando assim é, não é de excluir que essa fragilidade se reflita nos atos de criminosos de branqueamento de capitais associados a outros crimes, nomeadamente: o tráfico de drogas, a corrupção, a fraude fiscal e a fuga ao fisco”, sublinhou.

O presidente da Célula Nacional do Tratamento de Informações Financeiras da Guiné-Bissau (CENTIF – GB) afirmou que não existe terrorismo no país. Porém, sublinhou que não se pode também  dizer que a Guiné-Bissau não pode ser usada como um país para financiar o terrorismo, porque “uma coisa é o ato terrorista  em si e outra é o financiamento do ato de terrorismo”.

Para o presidente da CENTIF, o que pode acontecer num país frágil como a Guiné-Bissau onde não há controlo é imprevisível, porque pode ser usado para ajudar e contribuir no financiamento do terrorismo, porque “os terroristas não têm contas nas instituições bancárias, investem nas pessoas e, em caso de necessidade, essas pessoas são usadas para atos  terroristas”.

“Constatamos que há um défice de sensibilidade sobre a questão de branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, mesmo aquelas pessoas que consideramos que têm formação base sobre essa matéria tem dificuldades, têm pouca compreensão do fenômeno de branqueamento de capitais”, afirmou.

Perante esta situação, Justino Sá defendeu ser urgente o GIABA formar pessoas, magistrados, especialistas nessa matéria, porque “só assim poderemos fazer face a esse flagelo que está a pôr em causa a estabilidade não só do circuito financeiro, como também a dos países que fazem parte da sub-região”.

Para Justino Sá, o combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo não se deve limitar apenas em ter vontade, mas também em ter homens à altura e que dominam a matéria, porque terão mais sensibilidade para investigar.

“A investigação em matéria de branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo não é aleatória, nem se faz com uma carta rogatória. Deve conhecer as instituições que têm  essa vocação, se não perde-se a linha da investigação”, precisou.

O também jurista de profissão notou  que não se pode investigar o crime de corrupção, de abuso de confiança, de peculato, de administração danosa sem ter por base o crime de branqueamento de capitais, porque o objetivo de corromper tem a ver com o branqueamento.

“Porque os branqueadores roubam ao Estado e investem esse dinheiro e é o que assistimos na Guiné-Bissau”, assinalou.

“Há investimentos desta natureza no país. Basta ver as casas que as pessoas constroem. Os  governantes, por exemplo, quando deixam a governação fazem investimentos de outro planeta, que vemos todos a olhos nus. Isso pode configurar branqueamento de capitais, porque a proveniência do dinheiro do investimento que fazem é duvidosa, ou seja, pode ser resultado de ato da corrupção na administração pública, porque  a maior parte desses investimentos não vem de dinheiros ganhos na lotaria ou de heranças”, disse.

Justino Sá avançou ainda que os dinheiros investidos na  construção de casas, lojas, minimercados, estações de combustíveis são dinheiros provenientes de atos da corrupção no aparelho de Estado.    

Por: Aguinaldo Ampa

Foto: A.A

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