[REPORTAGEM] O serviço de mototaxistas praticados nos bairros periféricos e algumas zonas no centro da cidade é visto por populares como uma “benção” ou um alivio para os seus sacrifícios de andar com as suas cargas da estrada principal até as suas casas, já que os transportes públicos e sobretudo táxis e toca-tocas não aceitam entrar nos bairros periféricos devido às más condições das estradas.
Não obstante as criticas de alguns passageiros sobre o custo dos transportes, dos mototáxis e a questão de higiene, mas veem os mototáxis como um alivio ou uma salvação, os mototáxis interpelados pela nossa reportagem criticaram duramente os comportamentos dos agentes dos serviços de viação, que afirmam que lhes fazem a vida negra aplicando multas exorbitantes.
Há anos era notável, inicialmente nas regiões, a utilização de motos como transportes públicos de passageiros entre aldeias e localidades de difícil acesso, mas com o andar do tempo este meio de transporte alastrou-se e começou de repente a circular na capital Bissau, com um histórico de acidentes, devido a não observância das medidas de segurança, porque “a sua regulamentação apenas foi adotada em 2021”.
A RECUSA DE USO DE CAPACETES PELOS CLIENTES É MAIOR “DILEMA” DE MOTOTAXISTAS EM DJOLO
A equipa de reportagem do jornal O Democrata visitou, esta semana, alguns pontos de paragem dos mototaxistas e motofretes em alguns bairros da capital, nomeadamente em Antula, em Djoló, em Empantcha, em Pissakc e em Madina, para acompanhar de perto como funciona o fenómeno de motoqueiros públicos na capital.
A equipa pôde constatar, logo pela manhã, na rotunda de Antula, na via que dá acesso a N´Dame, já na lateral do Prédio dos Antigos Combatentes, uma movimentação bem agitada e rápida com roncos de motos num vai e vem, sob buzinas e gritos de passageiros “ leva-me”, “Vais?”, uns até chamam os motoqueiros pelos próprios nomes à semelhança de outros pontos visitados pelo semanário.
Interpelado pela nossa equipa no bairro de Antula, um dos mototaxistas que circulam entre Antula e N´Dam, Midana Ialá Indame, contou que trabalha como mototaxista desde 2021, não por conta própria, mas um dia sonha ter a própria moto e construir o seu futuro.
Midana Ialá Indame contou que trabalha das 6 às 21 horas, sem um único dia de descanso, faz cinco dias para o proprietário da mota e dois dias como seu ordenado semanal, consegue recuperar o combustível e obter uma receita diária de quatro mil.
Midana Ialá Indame queixou-se da falta da ética profissional na atuação dos agentes da viação e da Polícia Trânsito que, segundo disse, “abusam dos seus estatutos profissionais para os roubar”.
Explicou que se um mototaxista cometer alguma infração, muitas vezes essas infrações não são cobradas de forma legal, porque “ao invés de os pagamentos serem feitos nos postos legais, são feitos diretamente nas mãos dos agentes no terreno e cada um cobra o valor que entende, o que acaba por gerar perseguições disfarçadas para a fiscalização dos mototaxistas”.
Admitiu que, apesar de terem licenças para circular apenas da rotunda de Antula a N´dam e outras artérias em “terra batida” nas periferias, arriscam e circulam nas vias proibidas e as vezes circulam até à chapa de Bissau, porque “a oferta financeira é mais lucrativa do que os ganhos obtidos nas vias permitidas pela direção geral da viação terrestre”.
“Exigem o uso de capacetes, a não circulação na estrada alcatroada, lotação e documentos, e às vezes atropelamos essas exigências por dinheiro”, assumiu.
Disse que as cobranças nas vias onde é permitida a sua circulação varia de 250 a 500 francos, mas nas zonas proibidas cada um aplica o seu tarifário.
Diariamente, segundo disse, conseguem arrecadar uma receita que varia de 4000 a 10.000 francos CFA´s, dependendo do fluxo de passageiros e das habilidades dos mototaxistas.
“Eu trabalho nos horários normais, uns trabalham da noite até de manhã, por isso os ganhos não são os mesmos”, detalhou.
Pediu que sejam melhoradas as condições das estradas de terra batida, porque os troços nessas condições, têm criado problemas à circulação e que seja aumentado o nível de segurança nos bairros, lembrando que muitos dos seus colegas foram espancados e assaltados por ladrões, bem como sofrem roubos de motorizadas.
“À noite, a circulação é mais arriscada e perigosa, os ladrões disfarçam-se, às vezes, de passageiros. Transportamos até pessoas armadas com cordas, camufladas de passageiros. Somos atacados com paus. Tudo isso é frequente nas zonas de pouca circulação, de pedras e lombas. Denunciamos várias vezes esses ataques nas rádios e nas esquadras, mas nada foi feito para mudar a situação”, disse.
Os mototaxistas interpelados denunciaram que a maior parte de clientes no bairro de Djolo (Gabu-Zinho) recusa usar capacetes, fato que lhes preocupa muito. O capacete é exigido pela viação e eles devem obrigar os clientes a usarem capacetes para a sua proteção. Essa situação tem deixado os mototáxis numa situação de “conflito” com a Polícia de Trânsito, que recorrentemente tem aplicado multas aos mototaxistas que não obrigam os passageiros a usar capacetes.
“Os nossos clientes alegam muitas vezes que, por falta de higiene, não podem usar os capacetes, alguns reclamam que não conseguem respirar com os capacetes, por isso recusam usá-los”, relatou Dauda Baldé, um dos condutores de mototáxis que faz transporte na estrada que liga Avenida Koumba Yalá a Djolo.
Baldé admitiu que os passageiros que reclamam a higienização de capacetes estão com alguma razão, porque alguns colegas não levam em conta a questão da higiene, sobretudo o lavar a moto e limpar os capacetes todos os dias. Acrescentou, neste particular, que é importante o uso de capacete para a segurança da pessoa.
O mototaxista disse concordar com a exigência dos agentes da viação e da polícia sobre o uso de capacetes, mas criticou o comportamento dos agentes de viação que a “todo o tempo exigem a renovação dos documentos da licença, às vezes emitem documentos provisórios e depois obrigam aos interessados a sua renovação periódica”.
“A licença emitida é cobrada a 13.000 francos CFA´s, o livrete custa 3.000 francos CFA´s, o seguro cobra-se 6.000 francos CFA´s e a carta de condução para os mototaxistas custa-nos 45. 000 FCFA”, informou, esclarecendo que, para além da carta de condução, os restantes documentos são emitidos para um período não superior a seis meses, caso contrário é multado ou detido por circular com documentos fora de prazo.
Desafiou os colegas a regularizarem os documentos e evitar de fugir dos agentes da inspeção, “ aliás isso dá-nos algum conforto de trabalharmos à vontade”.
Dauda Baldé afirmou que enfrentam muitas dificuldades no seu dia a dia, particularmente no que concernente à questão das estradas que considera “gritante”, frisando que “trabalham nesta via por curiosidade, porque as receitas não chegam para nada, nem para consertar as motorizadas”.
“Todos os dias temos que levar motos ao mecânico. É difícil assim, mas não temos por onde ir. Decidimos então encarar essa dura realidade”, lamentou e criticou que são obrigados pelas autoridades a cumprir a cumprirem as suas obrigações, mas pouco ou nada fazem para melhorar as vias por onde circulam.
“Se tivéssemos uma forma de protestar e fazermo-nos ouvir, faríamos ou deixaríamos de pagar as nossas contribuições e juntar este dinheiro para melhorar a estrada de Gabu-Sinho, onde trabalhamos”, disse.
Baldé, que trabalha já há cinco anos como mototaxista em diferentes bairros periféricos da capital, explicou que tinham uma associação que organizava a classe e obrigava todos os condutores a cumprir as formalidades ou exigências das autoridades.
Lamentou que atualmente, as estruturas da organização tenham deixado de funcionar, porque “agora cada um cuida de si próprio, uma situação que prejudicou bastante a classe”.
Sobre o transporte de doentes e seus acompanhantes para hospitais, explicou que são obrigados a fazê-lo, porque “a situação difícil do país os obriga a isso, ou seja, a má condição das estradas impede os táxis de circularem nos bairros e assumimos essa tarefa”.
Admitiu que assumem os riscos de levar dois e até três pessoas numa moto, mas quando são apanhados pela viação ou polícia são multados.
Abubacar Camará, um mototaxista que trabalha na estrada de Djolo, explicou à nossa reportagem que a maior dificuldade no trabalho do dia-a-dia é a falta de uma boa estrada. Lembrou que houve momentos em que foram obrigados a contribuir cada um com um valor de 1.500 (mil e quinhentos) francos CFA´s para comprar pedras para tapar os buracos naquela estrada.
Explicou que cobram 250 CFA´s por cliente, e às vezes por circunstâncias de vida aceitam receber 100 francos CFA´s para levar o passageiro até ao seu destino.
“Era muito bom que o governo levasse a sério a questão das estradas dos bairros periféricos e pelo menos colocasse aterro para permitir a circulação dos mototáxis, bem como os outros transportes urbanos “, contou.
Os citadinos do bairro de Djolo ouvidos pela nossa reportagem destacaram” o importante papel” dos mototáxis que fazem o papel dos táxis, mas criticaram os preços práticos, porque a “população não tem dinheiro e as pessoas são transportadas num ambiente de total insegurança”.
Para se inteirar melhor do funcionamento deste serviço e da questão de higiene em relação aos capacetes reclamados pelos clientes, a repórter de O Democrata fez uma viagem de Gabu-Zinho até ao Djolo e pagou um valor de 250 francos CFA´s.
A nossa reportagem confirmou a falta de higienização de capacetes reclamada pelos passageiros e os mototaxistas interpelados alegaram a falta de tempo.
O presidente do sindicato de mototáxis que operam entre o edifício “Sobrada” e Cuntum Madina, Djonfo Bá, disse que uma das maiores preocupações dos seus colegas tem a ver com a má condição da estrada, que “está praticamente intransitável e a situação dos bandidos que nos perturbam no período da noite com ameaças e assaltos”.
“Temos registos dos nossos colegas que foram assaltados e socorridos pelos agentes da Guarda Nacional que fazem serviços de patrulha naquela zona. No caso mais recente, conseguiram neutralizar o agressor e obrigaram-no a devolver o dinheiro que tinha tirado do mototaxista.
Recordou que a sua organização pediu a contribuição de seus associados para a limpeza do lixo no local usado como paragem dos mototáxis em Sobrade. Acrescentou que agora estão à espera do documento da Câmara Municipal de Bissau que lhes autoriza a usar oficialmente o espaço.

“MOTOFRETES” NÃO ESTÃO LICENÇIADOS A TRANSPORTAR PESSOAS SEM REGULAMENTAÇÃO OFICIAL
O presidente da Comissão Instaladora Nacional de Segurança Rodoviária, Maninho Gomes Fernandes, disse que apenas os mototáxis estão autorizados a transportar pessoas, não motofretes, por não existir ainda uma regulamentação para essa categoria.
“Para ser um mototaxista, tem de estar munido de uma carta de condução de categoria A profissional, depois passar no curso que dá acesso a uma credencial da viação e Transportes Terrestres. Não é apenas saber dirigir uma moto para ser um mototaxista, mas sim deve ser uma pessoa com requisitos e credenciada pela viação. Também a própria moto deve possuir características de segurança exigidas”, disse.
Assegurou que nenhuma moto é permitida a embarcar duas pessoas para além do motoqueiro, por isso são exigidas dois capacetes e colete este último ainda não foi definida a cor a ser usada.
Esclareceu que apenas nas estradas de “terra batida” é que são permitidas a circulação dos mototaxistas, mas que estes sempre violam, “por exemplo os motoqueiros do ponto de CITEC para a Madina não lhes é permitida a circulação”, esclareceu e disse que, na utilização de motofretes também são exigidas as mesmas condições para a circulação.
“A diferença que existe entre as duas categorias é que a uma motofrete é permitida circular nas estradas alcatroadas, apenas. Passageiros, não. Apenas cargas”, disse.
“Em Enxude, as motofretes são utilizadas para transportar pessoas em total insegurança e superlotadas. Embora não tenham ainda regulamentação, estamos a estudar as condições seguras em que talvez venham a transportar pessoas, porque “as nossas populações enfrentam dificuldades de falta de transporte em algumas zonas do país”, assinalando que querem substituir as carrinhas de aluguer, mas “é completamente errado”, porque “carrinha de aluguer pode levar até três toneladas”.
Disse que os regulamentos não estão a ser cumpridos nem pelos motoqueiros, nem pela polícia de trânsito.
Destacou que apenas uma minoria de agentes tentou cumprir, caso contrário, os motoqueiros estariam a cumprir o regulamento. Afirmou que mais de 60% dos motoqueiros na Guiné-Bissau não possui a carta de condução, nem conhece as regras de circulação e circula “a toa”, sem ética da profissão, indicando que os pontos indicados pela viação para a circulaçãodos mototaxistas são: Antula, três pontos, Djolo um único ponto e no Aeroporto também e a tabela de preço aplicada para essas zonas varia de 250 a 500 francos CFA´s.
Disse acreditar que é possível a consciencialização dos motoqueiros como também dos passageiros por via pedagógica sobre a segurança rodoviária, revelando já se desencadeou uma série de formações de consciencialização sobre medidas de segurança, particularmente nas utilizações das motos, envolvendo motoqueiros, polícias e entidades administrativas regionais.
“A iniciativa da nossa instituição é no sentido de reduzir o número dos motoqueiros que não possuem cartas e licenças de condução. Decidimos ministrar um o curso para a aquisição desses dois documentos, a carta de condução e a credencial”, acrescentou.
INSTRUTOR DE CONDUÇÃO RECOMENDA UM REGULAMENTO RIGOROSO PARA MOTOS-TAXIS
Para o instrutor veterano de condução, Fernando Gomes, a preocupação não deve assentar-se na chegada do novo tipo de transporte público, mas sim nos seus profissionais e nas condições técnicas-rodoviárias que o país tem. É da opinião que seja estudada com rigor e de acordo com a realidade guineense o regulamento dos mototaxistas e motofretes, de forma a evitar grandes brechas no futuro.
“Uma moto não se guia por si só e nem o carro, são os condutores os responsáveis, tanto pelos passageiros que levam, como para outros utilizadores da estrada. Temos notado com preocupação os acidentes de motos que são causados pelos próprios condutores através de manobras perigosas, principalmente nas regiões”, disse.
Fernando Gomes disse que o nível de condução no país está muito longe do esperado, porque a maioria dos condutores não respeita as regras.
“Condutor é uma pessoa que tem uma preparação técnica em veículos automóveis e conhecimento de regras de códigos de estrada, neste caso, conhecer sinais gráficos e suplementares e as regras de circulação. A estrada é de todos, carros, motos, bicicletas, peões, mas todos devem cumprir a regra de prioridade de passagem”, lembrou.
Disse que a atuação dos agentes da polícia de trânsito demonstra que têm pouco conhecimento de códigos de estradas, principalmente quando abordam um carro em andamento.
“Assistimos polícias recorrentemente sentados, a mandar o condutor descer da viatura, é um procedimento muito errado. O condutor deve ser respeitado”, criticou e disse que deve ser dado o respeito à carta de condução, por isso a sua atribuição deve ser rigorosamente aplicável.
Descartou a possibilidade de as escolas de condução serem responsáveis pelas más condutas dos condutores nas vias públicas.
“Há muita ignorância nos ensinamentos transmitidos nas escolas de condução e temos muitos motoristas que nem sequer passaram por uma escola de condução”, indicou.
Fernando Gomes disse que os sinais de semáforos estão muito mal colocados, o que acaba por complicar a situação dos condutores.
“A emissão de provisórios deve apenas acontecer em situações específicas e com pouca duração, isto é, dias para renovação ou recuperação da carta de condução”, frisou.
Por: Epifania Mendonça/Noemi Nhanguan
Foto: Marcelo Na Ritche



















