Crônica : A MALDITA MANDITA

Estou cá só. Sozinho no escuro a pensar na vida que penosamente vou levando. Vida que julgo nem digno de nome é. Sei lá porquê… Mas, como sempre, contento-me com o pouco que vou adquirindo para o meu sustento quotidiano. Teclo uma tecla no meu Computador, depois teclo outra; e, assim, as ideias vêm surgindo como um emaranhado de fios que vou tecendo para costurar este texto. Disse, há pouco, que contento-me com o pouco, e esqueci-me que o pouco não me agrada. Pois, quero é o máximo de tudo que faço tirar o melhor proveito possível. No entanto, nunca me contentei com a impossibilidade, pois julgo que em qualquer que seja projeto de vida, se no início não há nenhuma faísca na relação causa-efeito, não poderá haver o fogo que alimente tal ideal, ou tal projeto concebido.

Sendo assim, com o tempo tudo poderá desaparecer por não ter sido bem pensado, bem organizado para que possa ser bem executado.

O sentimento, com o tempo, acaba por desaparecer senão bem trabalhado quer na horizontal quer na vertical. Afinal, a superfície (horizontal) só faz sentido se tiver a profundidade (vertical). Ora, como sabemos, toda a falha processual acarreta indubitavelmente em fracasso na realização e/ou satisfação de qualquer sentimento.

Penso agora na mandita que está a fustigar o meu joelho esquerdo. Dói-me tanto que chego a rir da própria dor que deveras me acomete estupidamente.

Entretanto, aconselha-me – com deveras advertência – a minha namorada para ir ao Hospital tratar-me da maldita mandita. Mas o que ela não sabe é que esta dor também me fascina – até um certo ponto, é claro.

Dói-me. É sério. Só a que dor que me aflige dá-me ânimo para continuar a viver com esta mandita que é ter de conviver com a barbárie nesta cidade.

Assim, em formato de versos, traduzo meu pesar:

Os de sempre

Ei-los os malditos

Protetores

De interesses escusos

Importados na metrópole assassina.

 

Ei-los a perambularem-se

Feitos baratas tontas

Com bocas agudas

Compridas e fedorentas

A inventarem mentiras

A disseminarem calúnias

Por entre as ruas,

Através de pessoas desavindas

E a espalharem boatos

Sujando na Praça pública

Os nomes de cidadãos decentes

Com nódoas assassinas

Homens e mulheres sanguinários

– Os sanguessugas!

 

Ei-los a prostituírem filhas

De gente humilde

Em nome de “agente” ingente

Ou, quiçá, “informante” mentiroso e canalha

Do Ministério da Indiscrição

– A soberana indústria

De ceifar vidas alheias

(Ei-los os nocivos ao Estado).

 

Ei-los que para subirem na vida

Defecam suas nulidades

Nas exímias competências

As sábias vontades.

Ei-los que, maldosa e malvadamente, excluem os bons

E promovem os maus.

 

Ei-los doutores

E engenheiros

Vindos de universidades fajutas

Porém indecentes de caráter.

Pessoas que, à primeira vista, vê-se suas bocas trémulas

Cheias do mal de Parkinson

Das mentiras urdidas

Das calúnias infundadas

Nas mentes criminosas e assassinas.

 

Ei-los ladrãos diplomados

Nos Institutos de Pesquisas avançadas

Mas que nunca vão presos

Sempre soltos

Porque seus destinos são como produtos avulsos

Vencidos, e fora do prazo da validade.

 

Bissau, 21 de Julho de 2016.

 

É esta a mandita suja, vencida, e fora do prazo de validade que nos atormenta a todos nós. Nos corrói por dentro, e nos enfeia por fora.

 

Caro leitor d’O Democrata, até a próxima, que o cronista precisa dormir para tentar esquecer o desassossego pátrio.

 

 

 

 

Por : Jorge Otinta, poeta, ensaísta e critic literário guineense

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