reportagem: FALTA DE JUSTIÇA PERTURBA POPULAÇÃO DA REGIÃO DE GABU

A Justiça é um dos pilares fundamentais no funcionamento de um Estado democrático de qualquer Nação do mundo, porque o seu funcionamento ajuda a apaziguar as almas gémeas dos cidadãos que coabitam num espaço territorial e até no espaço da vivência familiar da população de uma determinada aldeia ou tabanca.

Na Guiné-Bissau, a pirâmide da Justiça é algo muito frouxo, cujo funcionamento é quase inexistente ou causa mais problemas de que a própria resolução de problemas, levando os cidadãos a recorrerem à Justiça popular, ou seja, a fazer uso dela com as suas próprias mãos. Isto porque, no seu entender o sistema de Justiça nacional favorece sempre quem tem o poderio económico.

Por outro lado, os cidadãos das Tabancas e das aldeias não olham com bons olhos o funcionamento do sistema da Justiça nacional, uma vez que além de o considerar moroso não resolve de uma forma eficaz as necessidades dos mais fracos que mais que precisem do melhor funcionamento da Justiça para poder fazer face aos mais fortes e poderosos.

As constantes renovações, ou melhor, as mudanças na pirâmide da Justiça nacional, a nível da Administração local e Sectorial, tem vindo a criar ainda mais problemas, sobretudo, em termos da sobreposição de competências, uma vez que policiais de protecção civil, régulos, chefes de tabancas e Administradores sectorias não conhecem muito bem a sua competência nem a sua área de intervenção na administração de justiça.

O afastamento dos régulos da administração da justiça, depois da independência e instauração de chefes de tabancas, nomeados pelos administradores de Estado deixava antever a pretensão do Estado em querer estabelecer uma nova forma de administração da Justiça nacional diferente com a da administração colonial. Mas, não se sabe, por que razão, o governo com o novo sistema de gestão administrativa da Justiça voltou a recuperar os régulos que agora coabitam com os chefes de tabancas, na administração do sistema nacional de justiça no nosso país.

Essa coabitação tem vindo a criar conflitos e incompreensão, sobretudo, entre os Chefes de Tabancas e polícias. Chefes de Tabancas acusam polícias de não respeitarem a justiça que eles promovem nas áreas sob sua jurisdição.

 

ROUBO DE GADOS E DIFAMAÇÃO NO CENTRO DE JUSTIÇA EM GABÚ

Perante essa coabitação conflituosa dos chefes de tabancas com os polícias e administradores sectoriais na gestão de Justiça que emerge em Gabú, roubo de gados, difamação, disputa de terrenos e calúnias como problemas mais candentes na pirâmide da justiça da região da Província do Leste do nosso país. A ineficiência da justiça sobre estes assuntos candentes leva aos habitantes da região de Gabú a recorrerem a justiça popular com as suas próprias mãos ignorando toda a intervenção das autoridades administrativas sectoriais. Porque, na visão de nos entrevistados, se os problemas chegarem a posse dos administradores locais a solução será, sem margem para dúvida, favorável às pessoas que têm maior poder económico. Reina na região a ideia generalizada de que quem tem poder económico é que ganha na justiça. Por isso, não faz sentido recorrer aos tribunais sectoriais que, na realidade, quase não funcionam no sentido de resolver os problemas candentes nas tabancas e nos sectores que compõem a região de Gabú, lamentam nos entrevistados.

No sector de Pitche, por exemplo, reina mais problemas de roubo de gado, plantação de drogas Yamba, violação sexual das mulheres e violência doméstica. As autoridades garantem a nossa reportagem que tudo deve-se ao facto de não haver, no sector, um Tribunal de Justiça. Na visão das autoridades administrativas do sector de Pitche, a 30 quilométros da cidade de Gabú, capital administrativa, somente com a intervenção da polícia de protecção civil local e régulos é insunficente para acabar com os crimes no sector, porque as pessoas julgadas nas corporações de polícias locais voltam a praticar, de novo, os crimes pelos quais tinham sido condenados.

O Administrador do sector de Pitche, César Lopes, advertiu que no seu sector a justiça funciona de uma forma muito lenta e de difícil solução. Por isso, nas suas palavras o sector precisa ter um tribunal de justiça sectorial, tendo em conta número de seções que o rodeia: Canquelifa e Buruntuma ambos a 60 e 67 quilómetros, respetivamente, da cidade de Gabú, capital da região que é habitada por um enorme número de população, que  quando há um problema intervém primeiro os chefes de tabancas, régulos de secções e, de seguida, a polícia da proteção civil, uma vez que não existe um tribunal sectorial. Se a polícia não conseguir solucionar o problema, o caso é transferido para tribunal sectorial de Gabú.

“Um dos maiores problemas da justiça no sector tem a ver com o roubo dos gados, que muitas vezes, a polícia da proteção civil não consegue resolver no local, por isso é necessário que haja um tribunal sectorial no sector, para que estes problemas que, às vezes, terminam em espancamentos até à morte se resolva; e se não houver a intervenção do tribunal – apenas a polícia, motiva a população a se reagir com as suas próprias mãos, alegando que os polícias não fazem justiça” explicou à nossa reportagem César Lopes

César Lopes asseverou ainda à nossa reportagem que no sector de Pitche não existem condições para o funcionamento dos serviços de saúde pública, existe apenas um centro de saúde que não reúne condições de funcionamento adequado, onde as mulheres grávidas, depois de darem luz são obrigadas a irem para suas casas sem repousar no centro, porque não há espaço suficiente onde elas possam descansar e ter um atendimento de médico apropriado, para que, ao mesmo tempo, os médicos se possam dar assistência às outras mulheres a darem a luz.

Aquele governante assegurou, igualmente, à nossa reportagem que as autoridades sectoriais estão bastante preocupadas com a abertura das nossas fronteiras, porque já estamos na época da chuva onde o país sempre se depara com problemas de surtos de diarreia, vômitos, cólera, paludismo e agora com este mais perigoso Vírus de Ébola que agita nossos vizinhos da Guiné-Conakry.

Por seu lado, o delegado de Serviços de Informação de Estado no Sector de Pitche, o capitão Adulai Baldé confirmou também a nossa reportagem que a questão de justiça no sector assenta-se mais nos casos da plantação de droga Yamba, violação sexual e violência doméstica das mulheres e problema do roubo dos gados ou dos gados que invadem os terrenos cultivados de outras pessoas.

Os cultivadores de droga Yamba detidos são sempre transferidos para delegacia regional em Gabú onde são ouvidos. Mas, muitas vezes, conseguem escapar com droga tendo em conta a forma como a cultivam. Droga Yamba é cultivado junto com semente de produtos de mesma espécie, e por isso, é preciso que seja realizada uma busca rigorosa nos terrenos onde as pessoas cultivam as suas frutas, sobretudo, neste momento em que já está a cair a chuva no nosso país.

Ainda de acordo capitão Adulai Baldé, as mulheres de sector de Pitche são vítimas da violação sexual e da violência doméstica, porque já houve caso de abuso sexual e violência doméstica em que vários autores foram detidos pela prática destes crimes, julgados e condenados no tribunal regional de Gabú e estão, neste momento, a cumprir penas. Mas, mesmo assim, e até então, continua a verificar abusos e violações sexuais das mulheres no sector. Por isso, é preciso que haja um tribunal sectorial que permitirá o acesso à justiça de uma forma muito rápida pelos populares.

A Presidente da Associação das Mulheres do Sector de Pitche, Idjatú Sané,  advertiu, à nossa reportagem, que a justiça funciona mal no sector. As mulheres que são vítimas de abusos sexuais e da violência doméstica, cujos autores não são punidos como deviam ser, uma vez que não há um tribunal sectorial. Os problemas são julgados por régulos que, muitas vezes, só apelam ambos a reconciliarem sem que os culpados paguem pelos seus actos bárbaros que cometeram. Por outro lado, se o problema for entregue nas mãos dos policiais, os autores acabam por ser detidos por alguns dias de prisão e libertados sem cumprir sequer metade de danos cometidos.

Idjatu sané revelou que as mulheres de sector de Pitche sofrem muito nos momentos de dar à luz, porque o centro de saúde não reúne condições suficientes. Se uma mulher não puder dar à luz normal, os familiares são obrigados a alugar um meio de transporte, a fim de a transportar para Hospital regional de Gabú a distância de 30 quilómetros com péssimas condições e inadequadas para o tráfego na região. Assim sendo, ela chega muito cansada no Hospital regional, correndo risco a ter um parto difícil com grandes riscos de poder perder o bebé ou a própria vida.

O régulo central de região de Gabú Saico Embalo revelou, a nossa reportagem que o poder de um régulo esta limitado apenas a sensibilizar as pessoas da sua comunidade para que não haja problemas de grandes relevâncias.O que na sua visão tem contribuído muito na diminuição dos casos da violação doméstica e agressões físicas entre os casais e jovens na comunidade. Portanto poder tradicional tem sido um parceiro muito importante na colaboração com o tribunal regional na gestão da Justiça.

Ao longo do percurso na região de Gabú a nossa reportagem constatou imensa dificuldade de funcionamento da justiça, sobretudo, no que diz respeito ao pessoal quadro do tribunal regional de justiça e do Ministério Público (MP) que se encontrava ausente do país por motivos de serviços. O mesmo facto aconteceu com os quadros da Direção Regional da Polícia de Gabú que alega que só com a autorização do Ministério Público em Bissau é que poderão prestar declaração à imprensa.

Por: Aissatu Só 

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