Grande entrevista (III/III): “PODEMOS TER NO PRÓXIMO ANO UM DÉFICE DE 200 MIL TONELADAS DE ARROZ”

D: Há agricultores que recebem todos os anos os apoios em sementes e materiais de trabalho, mas não conseguem conservar os materiais. Que medidas acha que devem ser tomadas para mudar o comportamento dos nossos agricultores?
RND: É verdade que devemos trabalhar para a mudança do comportamento dos nossos agricultores, porque não podemos ficar a oferecer os materiais e as sementes para a mesma tabanca e as mesmas pessoas. Precisa-se sensibilizar a populaçao que devem conservar os materiais bem como gerir muito bem a semente, para não ficar apenas a espera de apoios.

D: Fala-se que o ministério tem um Gabinete de Planificação Agrária (GAPLA) encarregue de participar na elaboração, seguimento e avaliação dos projectos. Há informações que indicam que nos últimos dois anos os projectos deste sector não prestam a conta a GAPLA, confirmas essas informações?
RND: Como prestar a conta a GAPLA? Penso que a GAPLA deve ter o mecanismo de fazer o seguimento e a avaliação dos projectos, de forma a apurar se o projecto está a ser gerido bem ou não, de acordo com a forma como foi concebido. O Banco Mundial contratou a GAPLA para avaliar o projecto PEASA, mas fizeram o trabalho completo e no qual contaram os pontos fortes e os pontos fracos do projecto.
Os funcionários do ministério recebem muito mal, pelo que isso influenciou muito nos seus trabalhos. Os técnicos da GAPLA muitos deixaram o gabinete para trabalhar nos projectos, onde podem ganhar entre 500 a 600 mil Francos CFA. Por isso abandonam o gabinete para trabalhar no projecto a fim de resolveram os seus problemas, porque têm família e precisam organizar as suas vidas. Neste momento a GAPLA não tem a capacidade de avaliar os projecto, dado que perdeu um grande número dos seus técnicos que estão a trabalhar nos projectos.

D: Fala-se que muitos funcionários do ministério de agricltura que estão nos projectos e organismos continuam receber os salários no ministério. Tem essa informação?
RND: Claro, isso acontece, porque os técnicos saem daqui para a missão de serviço e pedem uma licença ilimitada. É verdade que continuam a receber os seus salários no ministério da agricultura.

D: O senhor enquanto coordenador do projecto PEASA recebia o seu salário no ministério da agricultura?
RND: O Banco Mundial não me pagou como o coordenador. Coordenei o projecto com o salário do Governo. Portanto, isso é o maior constrangimento que deparei. Não consigo explicar a história que aconteceu a volta de tudo isso, mas digo apenas que é por causa do conflito de interesse, acabei por ser prejudicado. Banco Mundial sustentou que o projecto é do ministério da agricultura e eu pertenço ao ministério, pelo que não posso ter o salário. Podia receber se eu tinha pertencido a outro ministério, apenas nessa condição que eu podia receber.

D: Porque é que aceitou essa condição?
RND: Aceitei assumir o projecto para demonstrar que tenho a capacidade de executar o mesmo na base de transparência, a fim de provar o contrário daquilo que pensam dos guineenses. Se tínhamos um bom Estado, podiam assumir o meu salário, ou seja, iam pagar-me em função do trabalho que estou a fazer no projecto.
O Banco Mundial recusou pagar-me, mas o Estado da Guiné-Bissau podia pagar-me. Executei o projecto com toda a transparência até o próprio banco ficou satisfeito connosco, porque classificou o nosso projecto nos seus relatórios de excelente.

D: Na qualidade de técnico da agricultura, será que o país dispõe dos técnicos suficientes para apostar na mecanização da agricultura?
RND: Temos grandes técnicos para fazer avançar o sector de agricultura, mas precisa-se apenas da organização. Temos vários engenheiros de mecanização agrícola até que alguns não conseguem obter o emprego e outros estão nos projectos. Propõe na política do executivo que seja adquerido 500 tractores para o trabalho de campo agrícola, se conseguirmos isso vamos organizar a lavoura mecanizada no sentido de aumentar a produção de forma extensiva.
Como se sabe, existe duas maneiras de aumentar a produção. Faz-se de forma intensiva e extensiva de produção. Se o actual executivo conseguir durante essa legislatura 500 tractores que pedimos, garanto que faremos excelente trabalho bem como estaremos em condição de aumentar a produção.

D: Para finalizar a nossa entrevista, o senhor é conhecido como um mestre nas artes marciais (karaté), como é que consegue juntar artes marciais e o seu trabalho profissional?
RND: Quero contar um pouco da história em como apreendi artes marciais. Estudei na Checoslováquia, naquela altura havia agressão contra os negros estudantes. Então para poder me defender dos agressores resolvi frequentar a escola de artes marciais. Inscrevi-me na escola de artes marciais, éramos mais 300 pessoas, mas consegui ficar juntamente com um colega guineense.
Conseguimos sair muito bem até passamos a representar a nossa escola de karaté na competição na Checoslováquia. Karaté é uma arte espiritual, porque nos ajudava muito no estudo. Pretendíamos continuar a formação em artes marciais, mas havia pressão a partir de Bissau que queriam que voltássemos para trabalhar um pouco e depois regressarmos mais para o estudo. Voltei para a Guiné para trabalhar no ministério da agricultura, onde fiquei até 1985, ano em que consegui uma bolsa de estudos para os Estados Unidos de América.
Nos Estados Unidos continuei a praticar artes marciais até que um dia um dos meus professores me viu e pediu-me para ensinar os meus colegas.
Para mim, artes marciais são a forma de levar a minha vida. Depois confesso uma coisa: desde que comecei a práticar artes marciais nunca mais as usei para lutar.

O karaté é vida para mim. A minha atuação profissional é na base de rigor, disciplina e persistência, mas respeitando todo o mundo.

por: Assana Sambú

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