Ilha de Formosa: PREVALÊNCIA DE VIH-SIDA NAS GRAVIDAS E PARTOS EM CASA PREOCUPAM DIREÇÃO SANITÁRIA 

A prevalência de casos de HIV/SIDA nas grávidas e os trabalhos de partos em casa constituem uma preocupação à direção sanitária da ilha de Formosa, setor de Caravela, região de Bolama/Bijagós, sul da Guiné-Bissau. Os trabalhos de partos em casa continuam a ser um tabú nas ilhas e feitas pelas mulheres grandes (madronas) na base de técnicas tradicionais.    

A área sanitária de Formosa conta apenas com um centro de Saúde do tipo C, sem médico nem parteiras e os três técnicos de casa são todos enfermeiros. A área sanitária de Formosa abrange as ilhas de Nago, Maio, Chediã e Formosa, sem meios de evacuação, tanto para fazer ligação interilhas como a ligação marítima para a sede da região sanitária dos Bijagós.

O centro de saúde, que tem funcionado sem laboratório equipado, fornece os serviços de consulta externa, pré-natal, vacinação, planeamento familiar, partos, despistagem de HIV. Em caso de exames, os pacientes são obrigados a recorrer ao centro de Bubaque ou Bissau.

ONG´S APOIAM EVACUACÕES DE DOENTES NA ILHA DE FORMOSA 

‎Em caso de evacuação, os familiares e os técnicos recorrem à ajuda das ONG- Organizações Não Governamentais, sediadas em Formosa. Aproveitam também as boleias das ONG para cobrir outras ilhas, às vezes recorrem aos pescadores de Nago para fazer a consulta e vacinação.

‎Em entrevista concedida ao nosso semanário O Democrata, o responsável da área sanitária de Formosa Élsio José Marques, explicou que enfrentam a falta de água, sendo que o painel solar que alimenta o centro perdeu a capacidade e não consegue fazer subir a água.

‎Informou que a eletricidade é assegurada por quatro painéis solares instalados, tanto para a residência dos técnicos como para o centro. Outra dificuldade apontada é a deslocação para as três ilhas, sendo que o centro não possui transporte marítimo para fazer a cobertura das outras ilhas que fazem parte da mesma área sanitária.

‎“Há um número considerável de crianças nas ilhas cujas mães não conseguem meios para levá-las às consultas e às vacinas. As grávidas também enfrentam a mesma situação” disse.

‎A ilha de Formosa conta com duas motorizadas, colocadas à disposição dos técnicos para a sua deslocação para o seguimento de rotina dos trabalhos dos Agentes da saúde Comunitária (ASC) e para o processo de vacinação.

‎Sobre os medicamentos, disse que têm uma pequena farmácia com os medicamentos essenciais e que as doenças mais frequentes são o paludismo, a pneumonia e a diarreia.

‎“Somos três técnicos: dois enfermeiros de curso geral, uma licenciada e um pessoal de limpeza. Não temos parteiras. Somos nós que fazemos todos os partos” contou. Temos tido o apoio de 10 Agentes da Saúde Comunitária distribuídos pelas ilhas, seis em Formosa, dois em Nago, um em Chediã, um na Ilha de Maio. Na ilha de Formosa, tínhamos uma moto carro para as evacuações internas, mas que está avariado há anos. Recebemos recentemente da coordenação central de saúde comunitária uma motorizada e outra do Ministério da Saúde Pública. Neste momento, temos duas motorizadas que facilitam as movimentações ao nível da ilha de Formosa”, realçou.

‎Élsio José Marques mostrou-se preocupado com o número de casos de HIV/SIDA em Formosa, sendo que a prevalência é mais comum nas grávidas, uma vez que é raro ver as pessoas a oferecerem-se para fazer testes para saber da sua condição de saúde.

‎Segundo indicou, a consulta pré-natal torna-se a única forma de rastrear a doença, o que faz com que a prevalência seja maior nas grávidas.

‎“Se recebermos um caso de uma grávida, automaticamente tentamos convencer o marido a fazer teste e receber acompanhamento. Neste momento, temos em seguimento 15 casos, perdemos de vista 8 pessoas e três óbitos nessa área sanitária. Essas pessoas têm idades compreendidas entre vinte e vinte cinco anos. E a maioria é da ilha de Formosa”, afirmou.

‎Relativamente ao triângulo constituído entre habitantes, técnicos de saúde e curandeiros tradicionais, Élsio José Marques frisou que com a intervenção dos Agentes da Saúde Comunitária, conseguem inverter a situação, onde os próprios curandeiros orientam os seus pacientes a procurarem primeiro o centro de saúde.

‎”Mas em casos de mordidas de cobras  não dão benefícios à medicina convencional, recorrem imediatamente aos curandeiros tradicionais. Nos casos relacionados com quedas  de palmeiras, aí sim procuram o centro para receber os primeiros socorros, mas acreditam mais nos curandeiros do que na medicina convencional para o seguimento e recuperação”, criticou.

“NÃO LEMBRO DO ÚLTIMO ANO QUE RECEBI O SUBSÍDIO DE VELA” – RESPONSÁVEL SANITÁRIO

‎“O que nos preocupa mais são as madronas, por questões culturais o parto para os bijagós é um tabú, que não tem horizonte temporal para ser banido. Continuam a ter partos em casa, mesmo tendo todo o nosso seguimento durante a gestação. Se chegar o dia de parto preferem ficar em casa. Durante as consultas, se depararmo-nos com uma grávida que precisa de seguimentos especiais, torna-se difícil convencê-la para ser evacuada para a Casa Mãe em Bubaque.  Apesar dessa crença de que só os parentes próximos devem saber do nascimento do bebê, algumas ainda quebram esse tabú e procuram o centro. Estamos a evoluir lentamente e esperamos que, em breve, possamos ultrapassar essas barreiras. Às vezes procuram o centro, se o parto for crítico na aldeia”, assegurou, lembrando que,apesar dos agentes comunitários fazerem o seu trabalho de forma integral, as crenças tradicionais continuam a ser um dos maiores constrangimentos e fazem com que haja uma espécie de resistência.

‎Sobre os subsídios de isolamento, garantiu que estão em dia, mas “há colegas que ainda não beneficiam desse direito”.

‎”Relativamente ao subsídio de vela,  não me lembro do último ano que o recebi”, ironizou, para de seguida revelar que as consultas  são gratuitas para crianças de até seis anos de idade e os idosos, enquanto  as  de 7 a 14 anos de idade pagam 100 francos CFA’S  e os  de 15 anos pagam 250 francos CFA. E a gratuidade dos medicamentos para crianças acabou com o fim do PIME.

‎Élsio contou que o pagamento do pessoal de limpeza éassegurado a nível do centro de saúde, tendo defendido a ampliação do centro dado o crescimento populacional a nível da área sanitária de Formosa.

‎De acordo com o responsável sanitário, os dados do INASA– Instituto Nacional de Saúde, o centro cobre 3457 habitantes. O que para o enfermeiro, esses dados precisam ser atualizados, tendo em conta o fluxo de procura aos serviços sanitários, por isso “estamos a trabalhar com os nossos agentes para fazer um levantamento não só para termos dados esquematizados”.

‎Sobre a desnutrição das crianças nas ilhas, disse que não étão frequente, mas existem casos e que registam três casos semestralmente. Acreditou que tenha a ver com a intervenção regular dos ASC, que acompanha principalmente as crianças e grávidas. Também a dieta comunitária, tendo em conta que consomem mais produtos naturais.

‎“Na ilha de Nago faleceu uma criança com malnutrição, mas os pais acreditavam que era gato que estava fustigar a vida da criança”, lembrou e informou que regularmente os agentes recebem ações de formação, de acordo com a programação dos ACS, ao nível central.

‎Revelou que a gravidez precoce tem crescido nos últimos dois anos, principalmente nas aldeias mais distantes.

‎“Estamos numa zona do interior do país e as mulheres são submissas aos maridos. Não decidem sobre o número de filhos que desejam ter. Portanto, o planeamento familiar aqui é difícil e às vezes as mulheres fazem-no de forma secreta. O que também acaba gerando conflitos conjugais. Já testemunhei casos onde um marido que tentou retirar com faca o jadele da sua mulher”, revelou.

Por: Epifânia Fernandes

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